segunda-feira, 25 de maio de 2009

Um post meio a sério, meio a brincar... e um desafio!

Hoje vou escrever sobre contrato com eficácia de protecção para terceiros (Vertrag mit Schutzwirkung für Dritte). Não parem já de ler, peço-vos… não cliquem na cruzinha do vosso browser, por favor!

Descansem meus Amigos, não vos vou maçar muito com “juridiquês”, apenas o necessário para narrar uma insólita e interessantíssima decisão do Supremo Tribunal Alemão, BGH, lançar-vos um desafio e, por fim, deixar, se me permitem, um conselho, em especial aos meus Amigos do sexo masculino que visitem a Alemanha… Um espécie de “Os conselhos que vos deixo”, algures entre o António Aleixo e o Bruno Aleixo!

O caso é o seguinte:

Uma mulher dirigiu-se a um ginecologista com o intuito de encontrar um meio contraceptivo eficaz, tendo o médico prescrito a utilização do “Implanon” (para os mais curiosos, mais informações à cerca do funcionamento do referido método em http://www.implanon.com/). Retenham este ponto importante para o desfecho da história: o médico e a paciente celebraram um contrato, o médico obrigou-se a prescrever um método contraceptivo eficaz para aquela paciente em concreto e, em contrapartida, a mesma pagou a consulta.

Azar dos Távoras: engravidou de um homem com quem não era casada, com quem não vivia em união de facto, de quem também não estava noiva, de quem não era namorada e com quem tinha apenas um caso.

Informado da contingência, o homem lá assumiu a paternidade da criança… No entanto, uma vez que não era casado nem unido de facto com a mãe da criança, foi, naturalmente, obrigado a pagar uma pensão de alimentos para sustento da criança. Até aqui, tudo normal, nada de extraordinário. Isto poderia bem acontecer em Portugal…

Em face do exposto, o pai decidiu processar o médico, pedindo ao Tribunal que condenasse o mesmo a indemnizar os danos que este lhe provocou. É fácil intuir quais os danos, nada mais, nada menos, do que o valor da pensões a que o pai ficou obrigado a pagar para sustento do filho.

Repare-se, em termos económicos, a racionalidade da decisão do pai: fez a criança, a guarda ficou entregue à mãe e médico que sustente a criança! Ou seja, dorme sempre descansado, ora porque não acorda com o filho a chorar, ora porque não te de se preocupar em pagar as pensões! No mínimo, inteligente…

O Tribunal condenou o médico a pagar uma indemnização ao pai, uma vez que deu como provado que violou as legis artis, isto é, que tinha actuado negligentemente na implantação do “Implanon” na paciente.

Devem estar a perguntar como isto é possível, uma vez que o contrato foi celebrado entre a mãe e o médico, sendo o pai um terceiro. Será um terceiro como qualquer um dos meus Amigos do sexo masculino? Não, por uma razão crua e simples: os meus ilustres Amigos, que eu tenha conhecimento, não dormiam com a mãe da criança! Mas só nesse ponto é que ele é diferente, porque de resto, nem ele, nem vocês, nem eu, nem mais ninguém no mundo é parte no contrato celebrado entre o médico e a paciente.

Juridicamente, e simplificando muito as coisas, o contrato celebrado entre o médico e a mãe da criança envolvia a protecção dos interesses do parceiro da mesma, embora este, formalmente, não fosse parte no contrato. Isto acontece porque a prestação do médico pode, potencialmente, contender não apenas com os interesses da paciente, mas também com os interesses dos terceiros que com ela mantêm relações sexuais, a isto se chama proximidade com a prestação (Leistungsnähe). Este terceiro tem ainda de ter também uma posição próxima à da parte do contrato, no caso a mãe, e haver interesse desta na sua protecção, o que no caso é claro (Gläubigernähe). Mais próximo da mãe da criança não sei se será possível… Resta um último requisito, que é o médico poder reconhecer a existência dos dois requisitos anteriores (Erkennbarkeit), isto é, da existência de terceiros face aos quais poderá a vir ter de responder pelos danos causados. Verificados todos estes requisitos, o tribunal teve de dar razão ao “pobre” pai…

Deixando para trás este "juridiquês", mais interessante era o caso de a criança ter sido produto de uma vulgarmente apelidada one night stand, ou, nas palavras do BGH, uma “relação não fixa de curto prazo” (ungefestigten kurzfristigen Partnerschaften), ou seja, uma fórmula elegante e distinta para evitar o uso da tradicional expressão anglo-saxónica... Será que, neste caso, o médico estaria obrigado a indemnizar? O problema é o seguinte: no momento em que a mulher vai à consulta, como envolver na protecção desse contrato os interesses de alguém com quem a dita não tinha qualquer relação e, muito possivelmente, nem sequer conhecia! Será este realmente um problema ou um argumento válido para negar, nesses casos, a responsabilidade do médico? Poderia o médico prever a existência de um futuro parceiro?

Lanço um desafio, um teste à sensibilidade jurídica dos meus Amigos, em especial à dos não juristas, ou à dos juristas que nunca tenham ouvido falar do contrato com eficácia de protecção para terceiros, o mesmo é dizer daqueles não formados pela Católica! Nos comentários que enviarem a este post, se enviarem, pedia que me dissessem qual deveria ser, na Vossa ilustre e douta opinião, a solução no caso de um simples one night stand. Deverá o médico, como no caso que vos referi, pagar ou não? Num próximo post recolherei as opiniões enviadas, as jurídicas, as não jurídicas, as mais ou menos jurídicas, as baseadas no bom senso ou na pura parvoíce, as quais analisarei e comentarei!

Por fim, o conselho que vos deixo:

A Alemanha é uma terra cheia de oportunidades… e de negócio!

Beijos e abraços do sítio de sempre,


7 comentários:

  1. anónima interessada25 de maio de 2009 às 15:45

    Em período de reflexão..

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  2. Parece-me apenas mais uma desculpa elaborada para os "pais" se furtarem ao pagamento das pensões de alimentos... Dúvida: os ilustres magistrados que assinaram a decisão seriam porventura todos do sexo masculino?!

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  3. É uma situação muito curiosa!!

    Mas eu acho que o médico deve pagar... Tem muito dinheiro, não vai fazer diferença :)

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  4. No mínimo a indemnização devia ter sido reduzida porque há culpa do lesado.

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  5. O terceiro de boa fé está sempre protegido :)

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